sexta-feira, 31 de agosto de 2007

Xetás

Cinco homens e três mulheres carregam a sina de serem os últimos de seu povo. Kuein, Tuca, Tikuein, Tiqüem, Rondon, Aãn, Ana Maria e Maria Rosa Tiguá são os sobreviventes de um grupo que, segundo estimativas de antropólogos, era formado por 450 indivíduos na época em que tiveram os primeiros contatos documentados com os brancos, em 6 de dezembro de 1954. Da cultura e dos
hábitos que tornaram os xetás diferentes de qualquer outro grupo indígena do Sul do país, restaram só algumas lembranças. A língua é falada por apenas três pessoas.
Os xetás podem ser considerados um povo genuinamente paranaense. Habitavam o Noroeste do estado, entre os rios Ivaí e Paraná. Na época do contato, já eram poucos. Estavam debilitados pela redução de sua área de domínio, ocupada pela agricultura cafeeira. “As disputas com outros povos, os conflitos internos e a fuga eterna dos brancos estavam fazendo a população xetá diminuir”, explica a antropóloga Carmen Lúcia daSilva,pesquisadora da Universidade Federal do Paranresponsável por um projeto de reagrupamento dos sobreviventes. Embora não se possa atribuir diretamente o fim dos xetás ao contato com os brancos, uma breve cronologia do povo mostra que a relação foi, no mínimo, desagregadora. O primeiro encontro foi uma iniciativa dos índios, que procuraram a administração da Fazenda Santa Rosa, no município de Douradina, uma propriedade que se tornou ponto de referência para o estudo da etnia. Eles sabiam que uma aproximação erainevitável, e deram o primeiro passo para evitar confrontos. Era uma estratégia de sobrevivência, conforme relata o mais velho deles, Kuein. Pelo visto, não deu certo.
Sete anos depois, expedições organizadas pelo Serviço de Proteção ao Índio (SPI, embrião da atual Funai) e pela Universidade do Paraná (hoje UFPR) não conseguiram localizar nenhum subgrupo xetá na floresta. O povo já não existia mais em seu estado original. A maioria havia morrido, por intoxicação alimentar, envenenamento, doenças e assassinatos. Os oito sobreviventes de hoje estão atualmente espalhados entre Santa Catarina, Paraná e São Paulo,
vivendo em cidades ou em reservas indígenas de outras etnias. Casaram-se com não-xetás ou com brancos, o que faz com que seus descendentes não possam mais ser considerados xetás. Mas deram sorte de ter recebido o auxílio de indigenistas, que os protegeram. "Se continuassem naquelas condições, seria muito difícil que alguém da etnia estivesse vivo até hoje", diz o assessor do governo do estado para assuntos indígenas, Edívio Battistelli. Até hoje eles só se reuniram duas vezes, a primeira delas há nove anos. "Um dia eu descobri que tinha dois irmãos, que tinham esposas e que tinham filhos. Descobri que eu tinha sobrinhos e que havia mais gente do meu povo", lembra, emocionada, Ana Maria Tiguá. Desde então, alguns dos xetás alimentam o sonho de viverem juntos novamente – um devaneio que pode tornar-se realidade. O projeto para reagrupar os xetás está em andamento desde 2000 e foi entregue à Fundação Nacional do Índio (Funai) na semana passada. Carmen não fala sobre o relatório, mas a idéia é que os oito xetás e seus descendentes ocupem uma área de 6 mil alqueires, entre Douradina eUmuarama.O ainda será discutido e depende da posse das terras, que não pertencem à União.O reagrupamento não é unanimidade entre os estudiosos da tribo.

Nenhum comentário: